domingo, 21 de julho de 2013

O Pelé me salvou

16- SINUCA DE BICO

Com dezesseis anos a gente se acha. Eu matava aula com os amigos para jogar sinuca. Quando a gente chegava no boteco, umas 8 da matina, tinha sempre um negro baixo e forte por lá, tomando sua cerveja. Quieto no seu canto. A gente não sabia o nome dele, logo virou "o Pelé".
Eu era um dos melhores na sinuca, assim, não gastava dinheiro na mesa. Os perdedores pagavam as fichas.
Até que um dia o tal Pelé me falou: -"Você tá jogando direitinho, branco. Vamos jogar uma partida? Quem perder paga?" Lógico que topei. Quando ia começar o jogo ele completou: -"mas com você, só vou jogar com uma das mãos". Percebi ali que eu estava entrando numa fria, mas era tarde para desistir.
Joguei direitinho e perdi com 4 bolas na mesa. Ele matou as suas 7, sem usar a mão de apoiar o taco. Uma vergonha. Mas, bom cabrito não berra. Agradeci "a aula", paguei a ficha e sai de fininho do boteco. Agora eu sabia que não era tão craque como eu pensava que era.
Pois bem. Algum tempo depois, eu e um amigo resolvemos ir em um lugar que se chamava "Casa dos Artistas". Tocava samba e o povo dançava animado. Vi uma morena bonita e comecei a dançar por perto. Sorrisos, olhares, tudo ia bem, até que chegou um "suposto dono da morena" querendo tirar satisfação comigo. Olhando mais atentamente, percebi que eu e meu amigo eramos os únicos não afro-descendentes no local. Me vi numa autêntica sinuca de bico. Ia apanhar mais do que vaca na horta. Mas de repente, não sei de onde, aparece o tal Pelé, encosta no sujeito e diz apenas: "o branquinho é meu amigo".
O cara pediu desculpas, se afastou e sumiu de vista. Não faço a menor ideia de quem era o tal Pelé. Se sambista, jogador de futebol, traficante, matador ou simplesmente craque na sinuca. Mas sei que ele era meu amigo e salvou a minha pele. Nunca mais o vi. Mas, por via das dúvidas, também nunca mais voltei na "Casa dos Artistas". Melhor não contar com a sorte de novo, né? Coisas que aprendi na sinuca.

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