18 -SOBRE NOSSOS TÚMULOS NASCERÃO FLORES AMARELAS E MEDROSAS
"Temporariamente não cantaremos o amor, que se refugiou mais abaixo dos subterrâneos. Cantaremos apenas o medo, nosso pai e companheiro" (Carlos Drummond de Andrade)
Este trecho do poema de Drummond me acompanha há tempos. Usei-o como abertura de minha redação no vestibular da UnB. Isso, em 1982. Acho que me ajudou entrar na faculdade e vir morar em Brasília.
Mas ele me ajuda também a entender o nosso "classe medismo", este mal que nos assola, desde sempre. No fundo, somos medrosos. Receio de perder o emprego, os bens, o carro novo, as pessoas que gostamos...etc, que nos faz covardes, injustos e, às vezes, até violentos.
Meu filho era pequeno, devia ter uns 3 anos (na foto ele já estava com uns 10, nesta fantasia de carnaval, que não deixa de ser uma piada visual com nossos medos) e descia para brincar debaixo do bloco (típica tradição brasiliense). Um belo dia o vejo brincando com crianças sujas, que pareciam ser de rua. Lógico, fiquei preocupado. Ele tranquilamente me explicou que "eram seus amiguinhos".
Controlei meu classe-medismo (sempre excludente) e observei a situação. Ele dividia seus carrinhos e brinquedos, todos se divertiam, pacificamente. Como os outros "riquinhos" não os tratavam assim, os "meninos de rua protegiam" meu filho, ajudavam a guardar os brinquedos e se despediam amistosamente quando iam embora. A inocência não-contaminada de meu filho me deu uma baita lição.
Apesar de nos considerarmos "esclarecidos", "espiritualizados" ou "do bem", temos que ficar atentos ao nosso "classe medismo". Ele é uma merda, só nos atrapalha e nos torna infelizes. Aprendi isso com meu filho.
quarta-feira, 31 de julho de 2013
quinta-feira, 25 de julho de 2013
Do you wanna dance?
17-PARECE QUE FOI ONTEM. E FOI.
Começou ontem o Brasília MotoCapital. Lá eu encontrei um amigo, músico, que tocou nos teclados junto com o Celso Blues Boy, dois anos antes, neste mesmo evento.
Ele comentou até sobre a jaqueta laranja que teria emprestado ao Celso para o show. Lembrei que um pouco antes dele subir ao palco fui até o camarim e fiz esta foto com o celular. O sorriso amistoso dele era uma retribuição a cachaça que eu tinha ido lhe entregar. No dia anterior, também no evento, ele havia me pedido uma garrafa da tal cachaça feita na fazenda de minha família. Promessa cumprida e registrada em foto.
Ontem, meu amigo tecladista me deu informações mais detalhadas. Celso já estava doente, isso a gente já sabia. O cachecol não apenas protegia o frio, como também escondia o tumor que ele tinha no pescoço. A voz já não estava boa, a cachaça aliviava a garganta e ajudava-o a cantar. O show foi demais. O próprio tecladista comentou isso. Além de me confessar que, ao final, ele estava tonto. Entendi perfeitamente. Eu era uma das poucas pessoas na platéia que sabia exatamente o que ambos bebericavam nos intervalos das músicas.
Disse-me ainda que o Celso Blues Boy pretendia tocar aqui de novo no ano passado, mas infelizmente, faleceu antes. Então, este foi seu último show. Parece que foi ontem.
Enquanto a gente conversava, rolava o show dos "The Fevers". Sim, aqueles mesmos, dos velhos sucessos. Depois de algum tempo parados, eles voltaram a tocar juntos exatamente aqui, no MotoCapital. Como diz a música deles: -"Eu perguntava do you wanna dance? E te abraçava do you wanna dance...um sonho a mais não faz mal"...
Começou ontem o Brasília MotoCapital. Lá eu encontrei um amigo, músico, que tocou nos teclados junto com o Celso Blues Boy, dois anos antes, neste mesmo evento.
Ele comentou até sobre a jaqueta laranja que teria emprestado ao Celso para o show. Lembrei que um pouco antes dele subir ao palco fui até o camarim e fiz esta foto com o celular. O sorriso amistoso dele era uma retribuição a cachaça que eu tinha ido lhe entregar. No dia anterior, também no evento, ele havia me pedido uma garrafa da tal cachaça feita na fazenda de minha família. Promessa cumprida e registrada em foto.
Ontem, meu amigo tecladista me deu informações mais detalhadas. Celso já estava doente, isso a gente já sabia. O cachecol não apenas protegia o frio, como também escondia o tumor que ele tinha no pescoço. A voz já não estava boa, a cachaça aliviava a garganta e ajudava-o a cantar. O show foi demais. O próprio tecladista comentou isso. Além de me confessar que, ao final, ele estava tonto. Entendi perfeitamente. Eu era uma das poucas pessoas na platéia que sabia exatamente o que ambos bebericavam nos intervalos das músicas.
Disse-me ainda que o Celso Blues Boy pretendia tocar aqui de novo no ano passado, mas infelizmente, faleceu antes. Então, este foi seu último show. Parece que foi ontem.
Enquanto a gente conversava, rolava o show dos "The Fevers". Sim, aqueles mesmos, dos velhos sucessos. Depois de algum tempo parados, eles voltaram a tocar juntos exatamente aqui, no MotoCapital. Como diz a música deles: -"Eu perguntava do you wanna dance? E te abraçava do you wanna dance...um sonho a mais não faz mal"...
domingo, 21 de julho de 2013
O Pelé me salvou
16- SINUCA DE BICO
Com dezesseis anos a gente se acha. Eu matava aula com os amigos para jogar sinuca. Quando a gente chegava no boteco, umas 8 da matina, tinha sempre um negro baixo e forte por lá, tomando sua cerveja. Quieto no seu canto. A gente não sabia o nome dele, logo virou "o Pelé".
Eu era um dos melhores na sinuca, assim, não gastava dinheiro na mesa. Os perdedores pagavam as fichas.
Até que um dia o tal Pelé me falou: -"Você tá jogando direitinho, branco. Vamos jogar uma partida? Quem perder paga?" Lógico que topei. Quando ia começar o jogo ele completou: -"mas com você, só vou jogar com uma das mãos". Percebi ali que eu estava entrando numa fria, mas era tarde para desistir.
Joguei direitinho e perdi com 4 bolas na mesa. Ele matou as suas 7, sem usar a mão de apoiar o taco. Uma vergonha. Mas, bom cabrito não berra. Agradeci "a aula", paguei a ficha e sai de fininho do boteco. Agora eu sabia que não era tão craque como eu pensava que era.
Pois bem. Algum tempo depois, eu e um amigo resolvemos ir em um lugar que se chamava "Casa dos Artistas". Tocava samba e o povo dançava animado. Vi uma morena bonita e comecei a dançar por perto. Sorrisos, olhares, tudo ia bem, até que chegou um "suposto dono da morena" querendo tirar satisfação comigo. Olhando mais atentamente, percebi que eu e meu amigo eramos os únicos não afro-descendentes no local. Me vi numa autêntica sinuca de bico. Ia apanhar mais do que vaca na horta. Mas de repente, não sei de onde, aparece o tal Pelé, encosta no sujeito e diz apenas: "o branquinho é meu amigo".
O cara pediu desculpas, se afastou e sumiu de vista. Não faço a menor ideia de quem era o tal Pelé. Se sambista, jogador de futebol, traficante, matador ou simplesmente craque na sinuca. Mas sei que ele era meu amigo e salvou a minha pele. Nunca mais o vi. Mas, por via das dúvidas, também nunca mais voltei na "Casa dos Artistas". Melhor não contar com a sorte de novo, né? Coisas que aprendi na sinuca.
Com dezesseis anos a gente se acha. Eu matava aula com os amigos para jogar sinuca. Quando a gente chegava no boteco, umas 8 da matina, tinha sempre um negro baixo e forte por lá, tomando sua cerveja. Quieto no seu canto. A gente não sabia o nome dele, logo virou "o Pelé".
Eu era um dos melhores na sinuca, assim, não gastava dinheiro na mesa. Os perdedores pagavam as fichas.
Até que um dia o tal Pelé me falou: -"Você tá jogando direitinho, branco. Vamos jogar uma partida? Quem perder paga?" Lógico que topei. Quando ia começar o jogo ele completou: -"mas com você, só vou jogar com uma das mãos". Percebi ali que eu estava entrando numa fria, mas era tarde para desistir.
Joguei direitinho e perdi com 4 bolas na mesa. Ele matou as suas 7, sem usar a mão de apoiar o taco. Uma vergonha. Mas, bom cabrito não berra. Agradeci "a aula", paguei a ficha e sai de fininho do boteco. Agora eu sabia que não era tão craque como eu pensava que era.
Pois bem. Algum tempo depois, eu e um amigo resolvemos ir em um lugar que se chamava "Casa dos Artistas". Tocava samba e o povo dançava animado. Vi uma morena bonita e comecei a dançar por perto. Sorrisos, olhares, tudo ia bem, até que chegou um "suposto dono da morena" querendo tirar satisfação comigo. Olhando mais atentamente, percebi que eu e meu amigo eramos os únicos não afro-descendentes no local. Me vi numa autêntica sinuca de bico. Ia apanhar mais do que vaca na horta. Mas de repente, não sei de onde, aparece o tal Pelé, encosta no sujeito e diz apenas: "o branquinho é meu amigo".
O cara pediu desculpas, se afastou e sumiu de vista. Não faço a menor ideia de quem era o tal Pelé. Se sambista, jogador de futebol, traficante, matador ou simplesmente craque na sinuca. Mas sei que ele era meu amigo e salvou a minha pele. Nunca mais o vi. Mas, por via das dúvidas, também nunca mais voltei na "Casa dos Artistas". Melhor não contar com a sorte de novo, né? Coisas que aprendi na sinuca.
quinta-feira, 18 de julho de 2013
Conheci a Rê Bordosa
15- MORREU PRA VOCÊ, ORAS
Depois de "encher a lata", praticamente impossível não conhecer a rebordosa. Mas, não é desta que estou falando. Poderia ser então "a personagem" criada pelo Angeli? Sim, poderia, diz o luso-descendente aqui. Mas além da figura dos quadrinhos, eu conheci uma "Regina", que por coincidência (?!?) foi a primeira esposa do Angeli, era, como posso dizer...um tanto "alternativa para os padrões de normalidade de nossa sociedade" e minha vizinha.
Isso aqui em Brasília, já tinha terminado a faculdade (ou estava no fim) e morava sozinho em um pequeno apto no fim da Asa Norte. A Regina dividia um apto com uma amiga minha de Ribeirão, que passou uns tempos por aqui. Em resumo, ficamos amigos.
Ela trabalhava com programação de computadores e depois soube, mudou-se com os filhos para uma chácara longe da cidade, sem eletricidade ou modernidades.
Uma vez, eu viajei em férias e deixei a chave do meu apto com a Rê. (Burro!) Quando voltei, lógico, parecia que tinha tido uma guerra naquele espaço pequeno. Mas, ela deixou um recado carinhoso em um livro que achou na estante: "Eu sabia que este seu humor tinha pai vivo". O livro em questão, chamava-se "Máximas e Mínimas do Barão de Itararé". Depois deste "elogio", relevei a bagunça e continuamos amigos.
Para encerrar, se alguém ainda tem dúvidas de que a Rê, ex-Angeli, seria mesmo a "musa" que inspirou a personagem, tenho a prova definitiva: Saindo do Beirute, depois de tomar umas tantas cervejas, nós dois mijamos no muro no fundo da quadra. AMBOS EM PÉ. Alguma dúvida, ainda?
Depois de "encher a lata", praticamente impossível não conhecer a rebordosa. Mas, não é desta que estou falando. Poderia ser então "a personagem" criada pelo Angeli? Sim, poderia, diz o luso-descendente aqui. Mas além da figura dos quadrinhos, eu conheci uma "Regina", que por coincidência (?!?) foi a primeira esposa do Angeli, era, como posso dizer...um tanto "alternativa para os padrões de normalidade de nossa sociedade" e minha vizinha.
Isso aqui em Brasília, já tinha terminado a faculdade (ou estava no fim) e morava sozinho em um pequeno apto no fim da Asa Norte. A Regina dividia um apto com uma amiga minha de Ribeirão, que passou uns tempos por aqui. Em resumo, ficamos amigos.
Ela trabalhava com programação de computadores e depois soube, mudou-se com os filhos para uma chácara longe da cidade, sem eletricidade ou modernidades.
Uma vez, eu viajei em férias e deixei a chave do meu apto com a Rê. (Burro!) Quando voltei, lógico, parecia que tinha tido uma guerra naquele espaço pequeno. Mas, ela deixou um recado carinhoso em um livro que achou na estante: "Eu sabia que este seu humor tinha pai vivo". O livro em questão, chamava-se "Máximas e Mínimas do Barão de Itararé". Depois deste "elogio", relevei a bagunça e continuamos amigos.
Para encerrar, se alguém ainda tem dúvidas de que a Rê, ex-Angeli, seria mesmo a "musa" que inspirou a personagem, tenho a prova definitiva: Saindo do Beirute, depois de tomar umas tantas cervejas, nós dois mijamos no muro no fundo da quadra. AMBOS EM PÉ. Alguma dúvida, ainda?
sexta-feira, 12 de julho de 2013
Macarrão com sushi
14-INTERNACIONAL INTERIOR
Terra roxa paulista, cercada pelos rios Grande, Pardo e Sapucaí. Sim, a vocação agrícola da cidade era inegável. Daí duas grandes colônias de trabalhadores rurais imigrantes eram comuns na região, os italianos e os japoneses. Se o Riobaldo, personagem do Grande Sertão: Veredas, dizia que o "Urucuia era o seu rio", o meu, é o Grande.
O melhor amigo de meu pai, companheiro de pescarias, era um italiano, casado com uma japonesa. O filho deles era um japinha esperto com sobrenome italiano. Um dia a mãe leva o garoto no médico e este tenta acertar a grafia do sobrenome escrevendo assim "Kahara". Mas não, era Carrara, mesmo.
Destas pescarias, antes do Rio Grande ter uma barragem para a hidrelétrica, lembro de ficar horas e horas apenas olhando a ponta da vara de pescar sobre as águas, esperando que alguma piapara ou mesmo lambari beliscasse. Nestas horas, a mente se aquieta e a gente não pensa em nada. Paz de espírito. Dizem os orientais que isso se chama meditação. Na época, eu não sabia.
Namorei algumas italianinhas e japinhas, se bem que as "mestiças" eram ainda mais bonitas. O resultado da combinação das duas colônias era exótica e muito interessante, tipo o design italiano com um tempero oriental. Acho que a "máquina" da fotinha ilustra bem, né?
Terra roxa paulista, cercada pelos rios Grande, Pardo e Sapucaí. Sim, a vocação agrícola da cidade era inegável. Daí duas grandes colônias de trabalhadores rurais imigrantes eram comuns na região, os italianos e os japoneses. Se o Riobaldo, personagem do Grande Sertão: Veredas, dizia que o "Urucuia era o seu rio", o meu, é o Grande.
O melhor amigo de meu pai, companheiro de pescarias, era um italiano, casado com uma japonesa. O filho deles era um japinha esperto com sobrenome italiano. Um dia a mãe leva o garoto no médico e este tenta acertar a grafia do sobrenome escrevendo assim "Kahara". Mas não, era Carrara, mesmo.
Destas pescarias, antes do Rio Grande ter uma barragem para a hidrelétrica, lembro de ficar horas e horas apenas olhando a ponta da vara de pescar sobre as águas, esperando que alguma piapara ou mesmo lambari beliscasse. Nestas horas, a mente se aquieta e a gente não pensa em nada. Paz de espírito. Dizem os orientais que isso se chama meditação. Na época, eu não sabia.
Namorei algumas italianinhas e japinhas, se bem que as "mestiças" eram ainda mais bonitas. O resultado da combinação das duas colônias era exótica e muito interessante, tipo o design italiano com um tempero oriental. Acho que a "máquina" da fotinha ilustra bem, né?
quinta-feira, 11 de julho de 2013
Sim, fui Adotado
13-MINHA FAMÍLIA ITALIANA
Se tivesse que escolher uma única imagem para retratar minha infância seria esta, o balanço na mangueira na casa do Vaguinho. Eram nossos vizinhos quando nasci. Dizem que nossas mães, ambas nos esperando, proseavam barrigudas no portão. Eu nasci primeiro, em setembro. Ele em outubro. Diferença pouca.
Eu só tinha uma irmã, 5 anos mais velha. Ele era o 3º filho do seu Orlando Maríngolo e da dona Ilda. Tinha um casal de irmãos mais velhos, o Valter e a Vilma. Depois veio a Vaninha, a caçula.
No quintal da casa deles tinha uma grande mangueira. E nela, um balanço. Acho que ficava mais lá, com eles, do que na minha própria casa. Fomos juntos para o primeiro dia na escola, alunos da dona Irma, outra grande amiga de nossas mães.
Estudamos juntos, na mesma sala, até a 5º série. Na 6º eu me mudei e fui para Ribeirão. Mas, continuamos amigos;Não me lembro de termos nos zangado um com o outro nestes anos todos. Nas férias de julho e dezembro eu sempre ia para Guaíra e ficava na casa deles. A dona Ilda dizia que "a minha cama" estava sempre pronta no quarto do Vagner, ao lado da dele. Na adolescência, eu era uma "criança" para sair em Ribeirão. Já em Guaíra não, a cidade era menor, a gente ia nas boates no Grêmio e arrumava as primeiras namoradas. Logo, sempre que podia eu ia pra lá, lógico.
No meio dos "italianinhos", eu era o "filho preto". Sim, eu fui "adotado" por eles. Uma família barulhenta, que discutia em todas as refeições, mas unidos como ninguém. Quando tinha 18 anos, chegando lá em Guaíra, a Vilma nos levava ao clube de campo e um caminhão acertou o carro. Até hoje tenho a cicatriz no meu olho esquerdo, foram 10 pontos. O Valter, o mais velho, foi o primeiro a se casar. Eu fui até Santos para ser padrinho em seu casamento. Ele me disse que os "padrinhos eram todos da família". Já seu Orlando, ex-camioneiro e dono de máquina de beneficiar arroz, me falava desaforos, que, segundo meu pai, se viessem de qualquer outra pessoa eu nunca mais olharia na cara. Só que, logo depois estávamos gargalhando ou tomando cerveja juntos. Era um grande coração.
Assim, prestes a completar 50 anos, eu posso dizer que tenho sim um irmão, amigo há 50 anos, o Vaguinho. Agora ele mora nos estranja, em Bruxelas. Mas, já foi convidado para minha festa de aniversário. Se puder vir, sabe que a nossa casa também será sempre a casa dele. Claro, né? Família é família. Aprendi isso com os italianos.
Se tivesse que escolher uma única imagem para retratar minha infância seria esta, o balanço na mangueira na casa do Vaguinho. Eram nossos vizinhos quando nasci. Dizem que nossas mães, ambas nos esperando, proseavam barrigudas no portão. Eu nasci primeiro, em setembro. Ele em outubro. Diferença pouca.
Eu só tinha uma irmã, 5 anos mais velha. Ele era o 3º filho do seu Orlando Maríngolo e da dona Ilda. Tinha um casal de irmãos mais velhos, o Valter e a Vilma. Depois veio a Vaninha, a caçula.
No quintal da casa deles tinha uma grande mangueira. E nela, um balanço. Acho que ficava mais lá, com eles, do que na minha própria casa. Fomos juntos para o primeiro dia na escola, alunos da dona Irma, outra grande amiga de nossas mães.
Estudamos juntos, na mesma sala, até a 5º série. Na 6º eu me mudei e fui para Ribeirão. Mas, continuamos amigos;Não me lembro de termos nos zangado um com o outro nestes anos todos. Nas férias de julho e dezembro eu sempre ia para Guaíra e ficava na casa deles. A dona Ilda dizia que "a minha cama" estava sempre pronta no quarto do Vagner, ao lado da dele. Na adolescência, eu era uma "criança" para sair em Ribeirão. Já em Guaíra não, a cidade era menor, a gente ia nas boates no Grêmio e arrumava as primeiras namoradas. Logo, sempre que podia eu ia pra lá, lógico.
No meio dos "italianinhos", eu era o "filho preto". Sim, eu fui "adotado" por eles. Uma família barulhenta, que discutia em todas as refeições, mas unidos como ninguém. Quando tinha 18 anos, chegando lá em Guaíra, a Vilma nos levava ao clube de campo e um caminhão acertou o carro. Até hoje tenho a cicatriz no meu olho esquerdo, foram 10 pontos. O Valter, o mais velho, foi o primeiro a se casar. Eu fui até Santos para ser padrinho em seu casamento. Ele me disse que os "padrinhos eram todos da família". Já seu Orlando, ex-camioneiro e dono de máquina de beneficiar arroz, me falava desaforos, que, segundo meu pai, se viessem de qualquer outra pessoa eu nunca mais olharia na cara. Só que, logo depois estávamos gargalhando ou tomando cerveja juntos. Era um grande coração.
Assim, prestes a completar 50 anos, eu posso dizer que tenho sim um irmão, amigo há 50 anos, o Vaguinho. Agora ele mora nos estranja, em Bruxelas. Mas, já foi convidado para minha festa de aniversário. Se puder vir, sabe que a nossa casa também será sempre a casa dele. Claro, né? Família é família. Aprendi isso com os italianos.
Tempos inocentes
12-YANKEES AT HOME
Entre os registros dos anos 60/70 estavam a coleção das revistas "Seleções", que em casa, eramos assinantes. Quando meu pai se mudou para o sítio, lembro que a estante guardava exemplares de vários anos deste período. Lidas nos dias de hoje se tornariam ainda mais engraçadas. Vendiam o "american way of life". No print acima, de 1958, informa ter a maior circulação mundial: "20 milhões de exemplares em 13 línguas". Era a época da chamada "Guerra Fria", demonizando o "inimigo comunista" e divulgando os "valores da família americana". Não por acaso, a seção de humor tinha o sugestivo nome de "Piadas de Caserna". Sim, vale lembrar que os militares estavam no poder por aqui e em vários outros países latino-americanos.
Entre os registros dos anos 60/70 estavam a coleção das revistas "Seleções", que em casa, eramos assinantes. Quando meu pai se mudou para o sítio, lembro que a estante guardava exemplares de vários anos deste período. Lidas nos dias de hoje se tornariam ainda mais engraçadas. Vendiam o "american way of life". No print acima, de 1958, informa ter a maior circulação mundial: "20 milhões de exemplares em 13 línguas". Era a época da chamada "Guerra Fria", demonizando o "inimigo comunista" e divulgando os "valores da família americana". Não por acaso, a seção de humor tinha o sugestivo nome de "Piadas de Caserna". Sim, vale lembrar que os militares estavam no poder por aqui e em vários outros países latino-americanos.
Mas, para mim, particularmente, o melhor eram os anúncios, pré-Procon ou pré-Conar. A começar pelo lay-out com ilustrações hoje chamadas de "vintage" ou pelos textos, de uma lógica absurda. Lembro de um, da coca cola, que afirmava que "era natural, pois utilizava-se de água filtrada em sua fabricação". Assim, carros, calças farwest (hoje conhecidas por jeans), eletrodomésticos e outros produtos de origem norte-americana passaram a ser "desejados" por consumidores do mundo inteiro. Em textos (mal) traduzidos, para 13 idiomas, como diziam.
Cheguei até a pensar em utilizar esta coleção antiga como material de pesquisa para um possível Mestrado em Comunicação (que não fiz), analisando o conteúdo dos anúncios no período. Acho que seria divertido. Não sei onde foram parar estas revistas que estavam lá no sítio. Talvez tenham ido para o lixo.
Até pouco tempo parece que existia a tal revista. Agora, claro, com menos popularidade e usando promoções duvidosas quanto a sua honestidade: "Você foi escolhido para ganhar um carro zero km. Assine a revista e saiba como"... Santa ingenuidade, né?
domingo, 7 de julho de 2013
Ladeira abaixo
11-GO, SPEED.
Acho que foi aos 7 anos que nos mudamos da rua 13, para a casa da rua 16. Ainda na 13, um quarteirão abaixo de casa começava uma ladeira que só ia terminar em uma curva, onde passava um riacho, uns 500 metros depois.
Minha diversão, depois do velocípede, foi um carrinho de rolimã. Felizmente, a cidade era pequena, nenhum carro nunca me encontrou em uma esquina, porque ladeira abaixo a velocidade do meu "bólido" era razoável. Depois que nos mudamos para a 16, já um pouco maior, eu mesmo cortava as madeiras e "incrementava" meu carrinho de rolimã. Pintei toda a madeira na cor branca e coloquei o nº 11 nele. Não sei porque, mas eu considerava o "meu número de sorte". Aconteceu também algumas vezes de ser o meu número na chamada da escola.
Quando fiz 18 anos, ganhei uma moto e pouco tempo depois já queria trocar ela por uma trail, só para participar de um campeonato de motocross. Meu pai ameaçou me internar em um hospício, abortando meus planos. Assim, minha brilhante carreira de piloto de corridas ficou mesmo no carrinho de rolimã n.º 11.
Acho que foi aos 7 anos que nos mudamos da rua 13, para a casa da rua 16. Ainda na 13, um quarteirão abaixo de casa começava uma ladeira que só ia terminar em uma curva, onde passava um riacho, uns 500 metros depois.
Minha diversão, depois do velocípede, foi um carrinho de rolimã. Felizmente, a cidade era pequena, nenhum carro nunca me encontrou em uma esquina, porque ladeira abaixo a velocidade do meu "bólido" era razoável. Depois que nos mudamos para a 16, já um pouco maior, eu mesmo cortava as madeiras e "incrementava" meu carrinho de rolimã. Pintei toda a madeira na cor branca e coloquei o nº 11 nele. Não sei porque, mas eu considerava o "meu número de sorte". Aconteceu também algumas vezes de ser o meu número na chamada da escola.
Quando fiz 18 anos, ganhei uma moto e pouco tempo depois já queria trocar ela por uma trail, só para participar de um campeonato de motocross. Meu pai ameaçou me internar em um hospício, abortando meus planos. Assim, minha brilhante carreira de piloto de corridas ficou mesmo no carrinho de rolimã n.º 11.
sexta-feira, 5 de julho de 2013
Na Cama do Bispo
10- COISA DE DOIDO
Quando minha irmã passou no vestibular, a família decidiu mudar-se para Ribeirão Preto. Meu pai não ia deixar sua única filha morar sozinha em um cidade grande (sim, perto de Guaíra, Ribeirão era uma megalópole). Daí que a gente se mudou em fevereiro, no início das aulas e meu pai só conseguiu a transferência no trabalho dele alguns meses depois. Enquanto isso, ele ficou hospedado no Seminário Católico. Ele era amigo do Padre, participava de ações sociais da paróquia...assim, o Padre lhe ofereceu os aposentos reservados ao Bispo. Como este nunca aparecia por lá, meu pai poderia utilizá-los enquanto precisasse. Lembro de meu pai comentar que a "cama do bispo" era muito confortável.
PS.: .Resolvi procurar uma imagem que retratasse "a cama do Bispo" e o google me entrega uma foto do artista plástico Arthur Bispo do Rosário, em seu ateliê-manicômio. Gostei mais. Então, fica sendo esta "a cama do Bispo".
Quando minha irmã passou no vestibular, a família decidiu mudar-se para Ribeirão Preto. Meu pai não ia deixar sua única filha morar sozinha em um cidade grande (sim, perto de Guaíra, Ribeirão era uma megalópole). Daí que a gente se mudou em fevereiro, no início das aulas e meu pai só conseguiu a transferência no trabalho dele alguns meses depois. Enquanto isso, ele ficou hospedado no Seminário Católico. Ele era amigo do Padre, participava de ações sociais da paróquia...assim, o Padre lhe ofereceu os aposentos reservados ao Bispo. Como este nunca aparecia por lá, meu pai poderia utilizá-los enquanto precisasse. Lembro de meu pai comentar que a "cama do bispo" era muito confortável.
PS.: .Resolvi procurar uma imagem que retratasse "a cama do Bispo" e o google me entrega uma foto do artista plástico Arthur Bispo do Rosário, em seu ateliê-manicômio. Gostei mais. Então, fica sendo esta "a cama do Bispo".
Documentos, por favor...
9-ORDENS SÃO ORDENS
Tinha um policial que morava perto de casa. Dizem que era um cara fechadão, de poucos amigos, que não conversava com as pessoas. Até que um dia, me viu na calçada pedalando meu velocípede e resolveu ser simpático, brincando comigo: "Você está dirigindo um veículo, mostre seus documentos por favor". Não tive dúvidas. Fiz como meu tio Adejaime tinha me ensinado: "mostrar os documentos" era abaixar o short e exibir meu pingolim.
Assim o fiz. O pobre policial não sabia onde enfiar a cara. Dizem que depois disso, ele atravessava a rua e evitava passar na calçada em frente de casa. E juro por tudo que é sagrado, eu nunca tinha ouvido falar em "trollagem".
Tinha um policial que morava perto de casa. Dizem que era um cara fechadão, de poucos amigos, que não conversava com as pessoas. Até que um dia, me viu na calçada pedalando meu velocípede e resolveu ser simpático, brincando comigo: "Você está dirigindo um veículo, mostre seus documentos por favor". Não tive dúvidas. Fiz como meu tio Adejaime tinha me ensinado: "mostrar os documentos" era abaixar o short e exibir meu pingolim.
Assim o fiz. O pobre policial não sabia onde enfiar a cara. Dizem que depois disso, ele atravessava a rua e evitava passar na calçada em frente de casa. E juro por tudo que é sagrado, eu nunca tinha ouvido falar em "trollagem".
quarta-feira, 3 de julho de 2013
Trauma de Infância
8- PROPAGANDA ENGANOSA
Alguns episódios marcam e talvez definam nossos rumos na vida. Comigo, aconteceu aos 3 anos. Televizinho, vi um comercial de um sabonete muito bacana, que na hora do banho, tocava uma musiquinha e o sabonete dançava.
Pois bem, fui na venda do "Seo Luís", comprei o tal sabonete e me preparei para ver aquele belo espetáculo. Tirei a roupa, liguei o chuveiro....e nada. O sabonete nem se mexeu. Não tive dúvida: coloquei-o de novo na embalagem e voltei ao armazém para reclamar com o "Seo Luís" que "aquele sabonete" estava com defeito, porque não dançava.
Na época, não se usava ainda o termo, mas posso afirmar que sofri "bullying" por muito tempo. Não podia passar em frente ao armazém que o povo lá dentro caia na risada. Injustiça. Eu só estava sendo um consumidor consciente, se defendendo de propagandas enganosas (Sim, o Conar e o Procon só vieram muitos anos depois).
Talvez por causa deste episódio eu tenha me tornado publicitário quando adulto. Mas, nunca coloquei sabonete dançando em nenhuma propaganda. Aprendi a lição.
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